Um comentário ainda atual

               Cunha e Silva Filho

 

       O texto abaixo é um comentário que há muito  tempo fiz  a propósito de  um artigo do escritor, ensaísta, dramaturgo piauiense Halan Silva. Visto ser ainda pertinente e atual a questão nuclear nele discutida, me decidi a republicá-lo. Infelizmente, não tenho  mais o texto deflagrador deste meu comentário.  de Halan Silva

      Em boa e oportuna hora vem o seu veemente e polêmico artigo, que põe a nu a situação ambígua e  provavalmente hipócrita de uma vaga posição de intelectuais piauienses, ainda muito colados à ideia de que um escritor piauiense deva ser sempre um piauiense, morar na terra de berço ou vindo se estabelecer no Piauí a fim de que possa ser acolhido no mundo movediço e cheio de prevenções e provincianismos  como, em geral, são as regiões do interior do país, e aqui incluo as capitais.

       Você, que já deu provas suficientes de que é um ensaísta sério e atualizado, amante da produção cultural piauiense, vem levantar todas estas questões concernentes a valores da terra mafrense e ainda a alguns tópicos fundamentais de historiografia literária e de julgamento crítico no Piauí intelectual.

      A sua última afirmação, no lúcido e fundamentado artigo, resume bem o cerne de todas as polêmicas e mal-entendidos que cercam a vida literária piauiense cujos nós e quiproquós(vale a rima) ainda estão muito presos a um passado que não tem sentido agora.

       Se a Universidade Federal do Piauí não deu (ou ainda não dá o justo valor a alguns autores locais, velhos ou novos, ou "novíssimos,” como diria Tristão de Athayde, a culpa é dela e da falta de  abertura  de um pensamento isento  de preconceitos para questões basilares deste porte.

      O que, a meu ver, precisa ser disseminado aí no Piauí (desculpe-me a inoportuna rima) é não só valorizar o escritores antigos e novos surgidos, mas também abrir-se para a compreensão de que o fenômenos literário não pode se limitar a um juízo meramente regionalista, cerceador da criação literária em sua dimensão universalista.

      A questão discutível de se denominar "literatura piauiense," "literatura de autores piauienses," "literatura brasileira de expressão piauiense" e outras denominações pouco enriquecedoras, só tende a insular os escritores da terra a um maniqueísmo inoperante e carente de solidez. A questão do valor estético no julgamento literário-crítico é o protocolo mais coerente da historiografia literária.

      O seu desabafo é justo e coerente. Se não houver mudança progressista e  atualização  com o fato cultural-literário vindo dos centros universitários locais, públicos e privados, não se poderá ir muito longe em direção a uma pesquisa autêntica e imparcial reconhecendo os valores da terra, sua produção, sem cerceamentos de qualquer natureza, porquanto o escritor deve ser medido pelo valor de sua obra em si, sem julgamentos apriorísticos e paroquiais subjetivistas e cheios de tabus críticos atingindo até a individualidade civil e as opções morais de um escritor.

       Nada de patrulhamentos ideológicos ( como justamente se queixava o saudoso poeta e sociólogo piauiense Clóvis Moura.  Nada de beletrismos que só abastardam e vilipendiam os valores da terra. Que os escritores piauienses sejam simultaneamente divulgados tanto no seu estado de origem quanto nos centros mais adiantados do país.

      Sem parti-pris, igrejinhas, grupelhos de índole facistoides - esses sim, os inimigos do saber e da pesquisa competente. Diferentes de você, que publica o que vale a pena e, assim, engrandece a cor local. Seu artigo deveria ser mais divulgado, sobretudo no Piaui.