[Maria do Rosário Pedreira]

A pandemia causou demasiadas mortes, mas muitas delas também aconteceram por razões que nada tiveram que ver com o mortífero vírus; e desde 2020 que estamos a perder, na nossa cultura, uma série de vultos insubstituíveis, ainda por cima a uma velocidade estonteante. Este ano já ficámos sem Jorge Silva Melo e o poeta Gastão Cruz, por exemplo, e o ano de 2021 tinha acabado pessimamente, com as mortes de Leonor Xavier e do músico Pedro Gonçalves, dos Dead Combo, tão jovem ainda e com tanto para nos dar. Mas perdemos muito mais artistas e escritores de nomeada desde 2020, incluindo o nosso maior e mais amado filósofo, Eduardo Lourenço, a ficcionista Maria Velho da Costa (Prémio Camões), os poetas Fernando Echevarria (e o seu bigode), António Osório e Pedro Tamen (tão delicados que eram!), o músico José Mário Branco ou o fadista Carlos do Carmo (que perdas tão grandes, caramba!), o historiador de arte José-Augusto França ou a enorme actriz e declamadora Carmen Dolores, que conheci em criança, pois o marido era colega do meu pai e os dois casais chegaram a viajar juntos. Também ficámos sem a deliciosa Isabel da Nóbrega (a quem uma vez pus as pilhas no aparelho auditivo para ela não estragar as unhas, e que cheirava sempre maravilhosamente), o homem da dança Gil Mendo, o actor Rogério Samora e o editor, escritor e muito mais que era João Paulo Cotrim. Às vezes penso, parafraseando o comediante Jô Soares: «Que mais nos irá acontecer?» Cuidem-se muito, sim?