"Nossas origens dizem muito a nosso respeito"

ENTREVISTADO:

Renato Barros de Castro

Dílson Lages Monteiro

Editor de Entretextos

 

Esta ponte da fotografia, construída em 1891, fica no distrito cearense de Caio Prado (pertencente ao território de Itapiúna), e é citada pela escritora Rachel de Queiroz no romance "Dôra, Doralina":

 

"Lá se passou a grande ponte do Choró que meu avô tinha trabalhado nela - e quando menina eu pensava quais vigas de ferro, quais pedaços daquele grande esqueleto tinham sido feitos pelo avô - e sentia orgulho, era como se aquela ponte fosse um pouco de herança minha".

 

Informações como essa é o que o leitor descobre em  "Uma estação, muitas histórias: crônicas de Itapiúna", recém-lançado, de autoria do escritor cearense Renato Barros.

Entretextos conversou com o autor de “Uma estação, muitas histórias: crônicas de Itapiúna".

 

A crônica parece ser um gênero feito para o diálogo com a cidade. Por que você escolheu a crônica para revelar olhares sobre a sua Itapiúna?

Renato – Uma das principais características da crônica é a proximidade com o leitor. Escolhi a crônica por ela proporcionar essa proximidade.

 

A escritura é a sombra de nossas marcas. No caso desse novo livro, quais as sombras que deram origem a ele?

Renato – Nossas origens dizem muito a nosso respeito, mas, por outro lado, não revelam tudo o que queremos saber: “De onde viemos, afinal?”. A origem sempre é um mistério para o ser humano, uma sombra, independentemente de ele saber quem são seus pais ou onde nasceu.

 

Qual o lugar da estação que dá título à obra, no livro e em sua vida?

Renato – A estação diz respeito a chegadas e partidas. Concretamente, a cidade se desenvolveu a partir dessa estação. Metaforicamente, a estação também traz outras simbologias. Uma delas diz respeito ao fato de o povo cearense ser reconhecido por sua capacidade de migrar e de se adaptar a lugares distantes. Ademais, as chegadas e partidas também dizem respeito às pessoas que conviveram conosco em determinado tempo e lugar, e que fizeram sua história, mas já não estão mais entre nós.

 

Sua veiculação à narrativa fantástica determinou o ethos do novo livro? Ou nada tem a ver?

Renato – A vida humana já é, por si mesma, uma narrativa do gênero fantástico. Esta atmosfera permeia o capítulo introdutório da obra, intitulado “Apresentação”, em que se permite uma abertura à imaginação. No restante da obra, entretanto, há um tratamento jornalístico.

 

Atualmente você se dedica a estudar academicamente a crônica. De que maneira, os estudos da crônica se reverteram sobre o novo livro?

Renato – Na verdade, o livro foi escrito em 2015, sendo portanto anterior aos meus estudos acadêmicos (mestrado) no âmbito da crônica. De todo modo, acredito que descobrir sobre o surgimento da crônica “moderna”, no rodapé dos jornais oitocentistas (acompanhando a produção de autores dessa época e dos que vieram depois deles), permite entender o motivo de esse gênero ser tão representativo da alma brasileira, agradando a um grande número de pessoas.

O que mais lhe trouxe satisfação em “Uma Estação, muitas histórias: crônicas de Itapiúna”?

Renato – Descobrir o protagonismo de pessoas anônimas em suas comunidades. Descobrir, também, a permanência de uma determinada tradição pela simples existência do interesse de uma só pessoa.

 

O que você espera que os leitores encontrem no novo livro?

Renato – Que as pessoas se vejam representadas e consigam perceber que fazem parte de algo maior, em que todas estão interligadas, e que diz respeito a nossa identidade cultural.

 

 

Renato Barros de Castro cursa Mestrado em Letras, na área de Literatura Comparada. Graduado em Comunicação Social (Jornalismo) na Universidade Federal do Ceará. Tem experiência na área de Letras e Comunicação. Autor do livro de contos "O mistério de Frida Zeiden", obra finalista do Prêmio SESC de Literatura de 2016, e dos livros de crônicas "Viagem a um Brasil insólito" (2015), vencedor do Prêmio de Incentivo à Publicação e Divulgação de Obra Inédita da Secretaria de Cultura do Estado do Ceará (SECULT), e "Geografia afetiva" (2011), vencedor do Prêmio Milton Dias. Também é autor do romance "Inventário das sombras" (2009) e de artigos em periódicos e obras bilíngues como "Plac Bohaterów Getta", publicada na Polônia.