Novo livro de contos de Luís Pimentel
Novo livro de contos de Luís Pimentel

A reinvenção da dor em Ainda tem sol em Ipanema, de Luíz Pimentel

 

Décio Torres Cruz*

 

Se você estiver buscando um livro para ler e ficar agarrado a ele do começo ao fim, Ainda tem sol em Ipanema (2023) lhe fará uma excelente companhia. Embora o belo título nos traga ecos de um renascimento da poesia da bossa-nova, este novo livro de contos de Luís Pimentel desconstrói essa imagem de uma Ipanema dourada dos anos 60-70 para abordar temas bastante variados sobre as diversas mazelas que assolam o nosso país e, também, o mundo.

Com bastante experiência na escrita jornalística e na arte narrativa, o autor utiliza vários recursos estilísticos e uma multiplicidade de técnicas que transformam a leitura do livro em um grande prazer estético. Ele conduz magistralmente os leitores por alamedas de diferentes modos narrativos e por caminhos sinuosos da linguagem, fazendo-nos descobrir os diversos personagens de carne e osso que compõem o seu mundo ficcional.

Publicado pela Editora Faria e Silva em 2021, a coletânea conta com trinta contos surpreendentes que capturam a nossa atenção do início ao fim.

Com pitadas de poesia na arte de contar histórias, Pimentel nos apresenta temas e personagens do dia a dia, transformando cenas corriqueiras em objeto de reflexão e empatia. E é assim que ele nos oferece um “prelúdio” com a música das ondas em um passeio à beira-mar no conto que abre o livro, para depois descrever algumas tragédias urbanas com as quais convivemos diariamente, seja por experienciá-las pessoalmente ou por delas tomarmos conhecimento através das notícias que nos chegam nos telejornais ou redes sociais: o soterramento de pessoas em desabamentos de prédios mal construídos em comunidades e o sofrimento da perda de familiares; incômodos e amizade de vizinhos; a internação de idosos por familiares gananciosos; o estranhamento ocasionado pela presença de uma mulher num bar de manhã cedo e o assassinato de um padre; os diversos caminhos percorridos por diferentes pessoas e sua indiferença aos destinos alheios em suas tribulações diárias; o racismo estrutural e a violência por parte de policiais contra a população negra e pobre; a exploração dos pais por parte de filhos inescrupulosos e tantos outros temas chocantes, mas cuja violência neles implícita já se tornou comum para a nossa sensibilidade anestesiada. Contudo, não espere o óbvio nesta leitura, pois o que aparenta ser banal torna-se inusitado e nos surpreende a cada página. O autor consegue destruir a nossa carapaça e nos faz readquirir o estranhamento e a empatia que se perdeu ao longo do caminho em meio a tantos absurdos. Como escreve Dênisson Padilha Filho no texto de apresentação da orelha, “os contos aqui reunidos vão inquietar, emocionar, fazer rir, chorar, talvez; porque eles reinventam nossas dores e, assim, dão a elas uma alegoria muito mais nobre do que qualquer epifania ingênua.”

O livro foi vencedor do Prêmio da Câmara Municipal de Sintra, em Portugal. Além desse, o autor recebeu diversos prêmios nacionais, como o Concurso Literatura Para Todos, do MEC, Prêmio Jorge de Lima, e o Prêmio Cruz e Souza, da Fundação Catarinense de Cultura, dentre outros.

Sobre o autor

 

Luís Pimentel é jornalista e escritor, nascido na Bahia e radicado no Rio de Janeiro. Escreveu diversos livros (obras infanto-juvenis, contos, poesia, textos de humor e sobre fatos e personagens da música brasileira), tais como: As miudezas da velha (1990); Contos para ler ouvindo música (2005); O calcanhar da memória (2006); Grande homem mais ou menos (2007), Todas as cores do mar (2007); Luiz Gonzaga (2007); Um cometa cravado em tuas coxas (2007); Contos da vida absurda (2014), dentre outros. Sua última publicação foi o livro de crônicas Saudades dos meus botequins - e outras crônicas de rua (2023). Seus livros podem ser adquiridos em diversas plataformas, sites de editoras, e livrarias.

 

 


* Décio Torres Cruz é escritor, membro da Academia de Letras da Bahia e da Academia Contemorânea de Lestras de São Paulo.