25 MESES

 

     Não é nada fácil ficar durante dois anos e um mês em um apartamento muito pequeno nos fundos de um prédio, convivendo com mais sete pessoas, sem poder sair nem falar normalmente  e tendo que fazer silêncio absoluto algumas vezes. Some-se a isso o fato de que três dessas pessoas eram adolescentes, uma delas com treze anos de idade, período da vida humana em que os hormônios estão explodindo, e a gente tem vontade de andar, de correr, de brincar, de gritar, de cantar, de ouvir música... Enfim, viver plenamente. Tudo isso numa época em que não havia televisão, e telefone era raro (no apartamento não havia um). Havia um rádio, mas raramente era ligado para não fazer barulho e não despertar suspeitas. Internet, celular e redes sociais? O mundo daquele período nem sonhava que um dia esses recursos de comunicação iriam existir. Além disso, havia o fantasma ameaçador da fome, sempre rondando aqueles oito seres humanos que não podiam sair para comprar comida. Eram ajudados por algumas pessoas amigas e caridosas que lhes levavam alimentos. Um ou outro às vezes saía furtivamente, mas sempre temendo ser preso.

     O mundo hoje sabe disso por causa de O Diário de Anne Frank, escrito por essa menina judia entre 12 de junho de 1942 e 1º de agosto de 1944. Ela, sua irmã Margot, seus pais e mais quatro pessoas viviam nesse esconderijo, fugindo da cruel perseguição nazista, pois eram judeus. Infelizmente, foram denunciados, presos e deportados para campos de concentração. Dos oito, somente o pai de Anne Frank, Otto H. Frank, escapou do holocausto e só veio a falecer em 1980.

     Ele editou e publicou O Diário de Anne Frank, um dos livros mais traduzidos e lidos no mundo. As edições mais recentes dessa obra contêm algumas intimidades que o pai havia eliminado das primeiras publicações, nada muito escandaloso para hoje, mas para a época... Otto não deve ser criticado por sua atitude de censor. Qualquer pai, sendo realmente pai, faria o mesmo também. 

     Um aspecto que se destaca muito na leitura desse Diário são as emoções que ele suscita, como a enorme pena que o leitor sente por Anne Frank; a tristeza em saber que ela alimentava (qualquer um de nós também alimentaria) a esperança de sair dali e levar uma vida normal; o nojo ao nazismo e, por extensão, a qualquer ditadura, seja ela de direita ou de esquerda.

     Porém o que causa mais nojo ainda é saber que no Brasil, um país tão etnicamente misturado, haja pessoas que defendem o nazismo. Um idiota de Santa Catarina enviou uma carta para um grupo de nazistas alemães, dizendo que se identificava com eles e pedindo filiação. A reposta veio rápida, curta e grossa: “Não aceitamos latinos!”

     O Diário de Anne Frank nos serve como uma base de reflexão que devemos fazer antes de reclamar da vida que levamos hoje, um verdadeiro paraíso se comparada com a que ela viveu. Algumas pessoas se maldizem porque não podem comprar um celular mais caro do que aquele que elas têm. Anne Frank, coitada, não podia nem ligar um rádio algumas vezes.

                                                      Washington Ramos