Saldo Insuficiente

[Chagas Botelho]

Se eu pudesse mudar algo em mim, mudaria, sem pestanejar, a minha altura. Acrescentaria uns centímetros a mais. Cansei de ser homúnculo. Parece que tudo está no topo do Everest e, portanto, longe do meu alcance. Não é exagero, acredite em mim. Todos os dias, constato isso na própria pele, isto é, na minha estatura mediana. Sou o contrário de muita gente que é toda grande, dos pés e das mãos até dos olhos.

Claro, o coração é grande, disso sei. No entanto, o meu tamanho liliputiano é um fardo. Careço de escada para alcançar a lata de leite, guardada no alto do armário. Para retirar os lençóis da última parte do guarda-roupa é necessário subir na cama. Para eu alcançar qualquer objeto que esteja nas alturas, um auxílio, um apoio é imprescindível. E é traumatizante. Esqueci-me de crescer. Ou se esqueceram de me esticar. A verdade é que tenho alta taxa de pequenez.

Deitado, tudo fica bem. Tranquilo. O problema não é na horizontal, e sim, na vertical. Sofro de oscilações para baixo e nunca para cima. É um horror. Queria que alguém me dissesse que o meu tamanho original fora trocado na maternidade. Que levaram embora um metro e setenta e dois (que eram meus) e deixaram um metro e sessenta e três (os que tenho agora), por engano. E que a troca logo seria desfeita. Como podem notar, ainda vivo com essa ninharia de altura.

Faça-me o favor de não vir com aquela estorinha de: “os melhores perfumes estão nos menores frascos”. Ou com aquela famosa frase de Fernando Pessoa: “sou do tamanho do que vejo e não do tamanho de minha altura”. Tudo, menos isso, por obséquio. Chega de humilhação. A falta de um comprimento maior já me deixa por demais aborrecido. É cada perrengue que passo que se for enumerar fico aqui a escrever até amanhã.

O derradeiro, por sinal, foi degradante. Sabe as argolas dos ônibus? Aquelas colocadas para o passageiro se segurar? Tentei agarrar uma, mas foi em vão. Altura insuficiente. Aí fiquei bolando durante a viagem de um lado a outro tentando não cair. Só mesmo sendo um Arthur Zanetti, campeão olímpico e mundial em argolas que, embora baixinho, tem impulso de sobra para agarrá-las, firmemente. Quanto a mim, não tenho porte de atleta e nem envergadura para tal façanha. Que triste destino é o meu.