0

Por todos esses dias a imprensa piauiense tem noticiado que até a próxima segunda-feira(17.1.2005) o governo maranhense vai editar portaria estabelecendo regras que restringem o ingresso da carne bovina oriunda do Piauí em seu território. Segundo o mesmo noticiário, a retaliação se deve ao risco de infeção dos animais piauienses com a febre aftosa. De fato, é um risco ao qual deseja se resguardar aquele vizinho, vez que o governo do Piauí ainda não conseguiu tirar nosso Estado do status de região de alto risco de contágio dessa doença animal.

Entretanto, nem sempre foi assim. O Maranhão já necessitou desesperadamente do abastecimento de carne bovina pelo rebanho piauiense. Aliás, os primeiros rebanhos que pisaram o solo maranhense foram oriundos das fazendas do Piauí. Desde o recuado ano de 1695, quando foi aberto o caminho entre a costa maranhense e o centro-sul do Piauí, que moradores da ilha do Maranhão vinham adquirir bovinos piauienses em troca de cuias, redes e pano de algodão. E foram essas primeiras matrizes responsáveis pelo estabelecimento das primeiras fazendas daquela parte da Colônia. Além disso, foram os fazendeiros piauienses quem colonizaram e estabeleceram as primeiras fazendas na ribeira do Balsas e no vasto sertão dos Pastos Bons.

E porque o rebanho maranhense, em quantidade e qualidade, sempre fora inferior ao do Piauí durante todo o período colonial, no final do século XVIII grande era a falta de carne em S. Luís do Maranhão, gerando verdadeira crise. Então, em face dos fazendeiros piauienses preferirem comercializar seus rebanhos nas feiras de Pernambuco e da Bahia, em maio de 1781, o governo do Maranhão, com jurisdição sobre o do Piauí, obriga os fazendeiros piauienses a abandonarem aquela tradicional rota conduzindo seus rebanhos para S. Luiz, via vale do rio Itapecuru. Para o melhor êxito do cumprimento dessa ordem manda o então subalterno governo piauiense proceder a um criterioso levantamento de todas as fazendas de gado vacum, declarando com toda a individuação o nome de seus donos e a quantidade de gado que produziam por ano. E que os obrigassem a conduzirem para o Maranhão os rebanhos que vendiam anualmente, por ser ali grande a falta desse alimento, e onde achariam bom preço e compradores certos. Porém, os advertindo que se não cumprissem essa ordem seriam punidos com a pena de transgressores e as mais que a livre arbítrio entendesse o governo. Assim, os ancestrais dos atuais criadores piauienses que não vendessem seus rebanhos no Maranhão seriam severamente punidos, passando a ser crime vendê-los em outros locais.

Portanto, o mesmo Maranhão que hoje impõe restrições para a entrada da carne bovina piauiense, nem sempre pôde se dar a esse luxo preventivo. Outrora, fora sustentada a sua população quase exclusivamente pela carne desse mesmo rebanho. Conhecedor da história dos dois Estados, não poderia escapar-nos essas observações.