[Flávio Bittencourt]

Manaus, tu nunca serás mais porto de lenha (basta aquela vez)

O editorial histórico [do fim de dezembro de 2011] que não disse isso.

 

 

 

 

 

 

(http://www.efecade.com.br/wp-content/uploads/2013/01/ONCA-PE-DE-BOI-2.jpg)

 

 

 

 

(http://4.bp.blogspot.com/-iIp2QEcz0Hg/UIyHr-7g56I/AAAAAAAABH0/UOC9q3ofSw8/s400/JornalDoComercioEspecial2012.jpg)

 

 

 

 

 

 "(...) a nossa aurora é agora, todos os dias."

 JCAM

 

 

 

 

(http://paneiro.blogspot.com.br/2012/10/jornal-do-commercio-edicao-comemorativa.html)

 

 

 

 

"Rua Epaminondas Baraúna

Bairro: Parque 10 de Novembro
Cidade: Manaus
Estado: Amazonas
 

CEP Rua Epaminondas Baraúna

69054-691
Válido para todos os endereços"

(http://www.brasilao.com/manaus/rua-epaminondas-barauna/)

 

 

 

 

PARA COLORIR:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(http://www.portalescolar.net/2011/08/dia-da-amazonia-55-atividades-e.html)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

(http://img2.mlstatic.com/livro-estorias-amaznicas-epaminondas-barahuna_MLB-O-185733110_1086.jpg

 

 

 

                                  

                                          A EPAMINONDAS BARAHUNA, que esplêndidamente dirigiu o JC,

                                          EM MEMÓRIA

 

 

 

9.7.2013 -    F.

 

 

JORNAL DO COMMERCIO,

DE MANAUS:

 

"31/12/2011

Editorial

Nem parece que já se passou mais de um século desde que circulou a nossa primeira edição.
Vivemos e fizemos nesse período a própria história do Amazonas, e hoje já somos parte dessa história, um relato que foi contado dia a dia, sob o olhar atento dos nossos jornalistas, dos nossos articulistas, com o apoio fiel dos nossos leitores e anunciantes.
Acompanhamos o auge da transformação de Manaus em Paris da Selva, e em seguida o seu declínio a porto de lenha. Noticiamos o mundo vivendo a sua 1ª Grande Guerra, a primeira grande crise econômica mundial com o Crack de 29, e da nossa trincheira assistimos ao renascimento do militarismo no mundo.
Acompanhamos as nações em sua 2ª Grande Guerra, e com ela o renascimento efêmero do fausto da borracha no Amazonas. Ouvimos e publicamos o grito vibrante do tuxaua Álvaro Maia em seu 'Recado Amazônico', cobrando à nação um olhar e uma ação diferenciada para o nosso rincão esquecido.
Reportamos a ditadura do Estado Novo no país, o sonho e o progresso na democracia dos Anos JK e atravessamos os Anos de Chumbo da ditadura militar, com seu rastro de elefantes brancos e esqueletos desconhecidos. Raiou a liberdade e estávamos lá publicando as fotos dos jovens Caras Pintadas e do velho Senhor Constituinte.
Por aqui sobrevivemos à estagnação de décadas até a chegada da Zona Franca de Manaus e estivemos presentes na fabricação desse novo sonho: reportamos o modelo econômico desde a viagem do Marechal Castelo Branco descendo o rio Amazonas no Rosa da Fonseca, em que o saudoso Sócrates Bonfim foi uma das cabeças pensantes no esboço inicial do modelo ZFM.
Acompanhamos a implantação desse projeto estratégico de desenvolvimento que atravessou e sobreviveu ao Milagre Econômico da ditadura, sofreu contenções, ameaças, agressões políticas e por fim, moldou-se ao formato amazônico, sustentando não somente a nossa economia, mas também a nossa floresta em pé.
E hoje, tudo isso transformado em história registrada e catalogada em microfilmagem, constituindo um acervo histórico dos mais relevantes do nosso Estado e do país.
E nem parece que já se passou mais de um século, pois continuamos aqui, na trincheira da notícia, informando, analisando, construindo com o leitor o hábito de ler o melhor, o diferenciado, a boa notícia.
Por tudo isso, 2012 não é somente o nosso 108º ano. É o 8º ano de um novo século que pretendemos noticiar e historiar; sem temer crises nem guerras. Pois a nossa aurora é agora, todos os dias.



Redação JC"

(http://www.jcam.com.br/noticias_livre_detalhe.asp?tit=Editorial&n=32728)

 

 

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Epaminondas Barahuna

ONÇA PÉ-DE-BOI

 
 
 

Como se não bastassem todos os perigos positivos e imaginários que atormentavam os intrépidos nordestinos que demandavam a Amazônia no tempo da penetração e desbravamento dos seringais, e, muito particularmente, os iniciados nos mistérios das selvas e das águas, os chamados “brabos”, quiseram ainda a fantasia e o espírito criador do povo, no caso especial os veteranos exploradores da floresta, os integrados ao meio, gerar mitos, animais fantásticos, ainda mais aterradores do que aqueles já notórios. Era o caso da onça pé-de-boi. Não bastavam as diversas variedades conhecidas, pintada, canguçu, suçuarana, preta, vermelha, maçaroca e outras, todas elas representando um perigo real, mas eram nada, já que os indomáveis seringueiros as dominavam e abatiam com o seu rifle infalível. Havia que ser suscitado algo mais do que o sabido, para levar o terror ao florestário inexperiente, ao neófito nas tarefas interioranas, nos meandros e intimidades da selva. Teria surgido assim a lendária onça pé-de-boi, animal fabuloso, cuja ferocidade e valentia estavam acima da de todas as outras feras que constituíam o elenco da nossa fauna. Esse animal assombroso tornou-se lenda na região, particularmente no Amazonas e Acre. O nome prestava-se bem para a sua promoção nos espíritos simples. Dir-se-ia selecionado a capricho por um profissional, segundo as modernas técnicas de comunicação de massa. Servia maravilhosamente à finalidade. A onça pé-de-boi devia ser realmente coisa muito séria, muito pior do que todas as diversas espécies catalogadas ou classificadas. Como bom mito ganhou terreno, generalizando-se numa larga faixa regional, somando mais uma apreensão entre os seringueiros, e muito especialmente, se era um recém-chegado dos seus pagos no Nordeste.
Talvez pelo seu porte a onça é o terceiro felino do mundo em tamanho e força ocupando um destacado lugar nas preocupações do homem do campo, é de se notar, ela deu abundante matéria-prima à imaginação das populações do interior brasileiro, para enriquecer a mitologia das diversas áreas onde ela ocorre, praticamente todo o país. Assim sugiram, além da nossa muito amazônica pé-de-boi, a Onça-Borges, nos extremos oeste de Minas Gerais; a Onça-Cabocla, na região do rio São Francisco; a Onça-Mão-Torta, no Estado de Goiás, e, alhures, a Onça-Maneta, por isto mesmo ainda mais feroz, todas elas acrescentando a sua parcela de terror onde se atribuía a sua presença.
A onça pé-de-boi incorporou-se à mitologia da Alta Amazônia, e, segundo se dizia, tinha a forma normal de um animal dessa espécie, com a particularidade de possuir as duas patas traseiras semelhantes às do boi. Outros admitiam que essa anomalia se estendia às quatro patas.
Suas vitimas prediletas eram os “brabos”, que, quando não devorados pela superfera, pelo menos padeciam do medo por ela inculcado, estimulado pelo espírito galhofeiro dos companheiros veteranos que intencionalmente os intimidavam, pintando a ameaça da pé-de-boi com as cores mais carregadas e sombrias. Num seringal ocorreu, ainda naqueles recuados tempos da abertura de estradas, um episódio interessante, que, se não confirma a existência da fera, pelo menos ratifica a inquebrantável coragem dos antigos seringueiros, como veremos:
Um “brabo”, jovem de aproximadamente vinte anos, foi destacado para trabalhar num centro bastante afastado, em companhia de dois outros seringueiros já ambientados e afeitos às coisas do meio. Os dois veteranos trataram de amedrontar o novato com o terrível perigo da onça pé-de-boi, inclusive informando-o de que, na área coberta pela sua “estrada”, existia essa fera, pois já haviam visto as pegadas. Quase todos os dias, antes de partir para o trabalho, ele ouvia uma recomendação que cada vez se tornava mais tétrica : “cuidado com a onça pé-de-boi !” O rapaz, que aliás era de bons princípios e sabia ler e escrever razoavelmente bem, vivia seriamente apreensivo, principalmente porque não havia ainda adquirido um rifle ou espingarda. Sua arma ainda era, precariamente, um terçado Collins 128, no qual confiava, mas não o bastante para enfrentar uma semelhante fera. Mesmo assim cumpria a sua tarefa, com todos os sentidos atentos ao menor ruído ou movimento que percebia na floresta. Até mesmo a hipótese de se trepar numa árvore, para escapar, num caso de emergência, fora abandonada, pois os companheiros haviam assegurado que se tratava de um casal de onças e que elas eram bastante espertas para aguardar todo o tempo, no tronco da árvore, que a vítima fosse forçada a descer. Para continuidade da vigilância, revezavam-se na caçada, no interesse da alimentação. Era realmente difícil escapar. Não obstante, com todos esses riscos calculados, o rapaz se fazia diariamente rumo a “estrada”, ainda que não estivesse longe de se ver frente a frente com a fera.
Foi o caso que certo dia ouviu um ruído de pesados passos na mata e logo brandiu o seu famoso Collins 128. O animal caminhava de cabeça baixa, aparentemente sem vê-lo, por uma estreita vereda imediatamente ao lado da “estrada”, que nesse local passava à margem de um igarapé, e, na direção que tomava, vinha passar quase rente a ele. Disso resultou que dentro de instantes estabeleceu-se uma luta furiosa e selvagem. Ao atingir o alcance do seu terçado, o seringueiro lançou-se de um salto para a frente e golpeou violentamente no meio da espinha dorsal, com rara felicidade, pois logo o animal caiu em tremendas convulsões, aos pulos, mas sem jamais conseguir se firmar de pé. Ato contínuo, o homem investiu como pôde, e golpes sucessivos foram desferidos a esmo, sempre acertando em cheio, enquanto a vítima, em desesperados estertores, escorregava barranco abaixo, na direção da água do igarapé. Finalmente, tão fundamente ferida, exauriu-se, morreu. Foi então que se registrou uma cena patética naquele ermo, naquela solidão, apenas testemunhada pelas árvores e pelo vento: o homem, vitorioso, exultante, embriagado pelo sucesso, trepou sobre o corpanzil do animal inanimado e proclamou, a plena força dos pulmões, num brado estentórico de exaltação: “Se tem onça pé-de-boi por aqui que apareça !” Por sorte dele,não havia e nada aconteceu. Então, como um troféu para dar testemunho do seu inaudito feito, cortou a ponta da cauda e a orelha da fera e guardou em sua sarrapilheira, para exibir triunfante aos companheiros.
Como houvesse tardado bastante o regresso, quando ainda na “estrada”, os encontrou, pois já seguiam à sua procura, apreensivos. Ao primeiro contato, indagaram sobre os motivos do retardamento, ao que o nosso herói foi logo transmitindo a boa nova: “matei a onça pé-de-boi”. Os homens ficaram estupefatos com a inesperada informação, mas ele foi bastante objetivo: juntando o ato às palavras, tratou de comprovar o feito e apresentou, repontando o mais justificado orgulho, a cauda e a orelha de uma anta. Os companheiros, antes atônitos, divertiram-se bastante, mas imediatamente seguiram adiante, para o aproveitamento da saborosa caça.
Daquele dia em diante, a onça pé-de-boi não apareceu mais naquela estrada e seguramente foi fazer assombração em outra parte! [Estórias amazônicas. Rio de Janeiro, Edições "O Cruzeiro", 1974]

(http://br.reocities.com/rogelsamuel/barahuna.html)