[Maria do Rosário Pedreira]

Muitos escritores portugueses sentiram na pele a repressão do Estado Novo e viram os seus livros proibidos ou riscados pelo lápis azul da censura. Mário Soares, que na época escrevia nos jornais com pseudónimo, apercebeu-se, porém, de que alguns dos censores eram bastante burros e conseguia dar-lhes a volta com uns truques estilísticos, poupando alguns dos seus artigos a cortes ou à simples proibição de serem publicados. Mas, pelos vistos, não foi só em Portugal que a censura teve agentes que não conseguiam ir mais longe do que a sua fraca inteligência. Juan Marsé esteve recentemente em Portugal para lançar Caligrafia dos Sonhos, a que voltarei quando a leitura estiver feita, e a uma pergunta do público sobre os incómodos da censura na Espanha franquista, respondeu com uma maravilhosa revelação. Tinha escrito um romance que era claramente contra o regime e decidira publicá-lo no México, consciente de que, se o fizesse no seu país, arranjaria seguramente problemas com a Polícia política. Porém, os seus receios acabaram por parecer-lhe injustificados quando os censores o chamaram mais tarde e, curiosamente, aquilo que tinham para lhe apontar era o facto de abusar das palavras «mamas» e «coxas»...