FOGUEIRA DE VAIDADES

     O título acima não é original desta crônica. Ele nomeia também um livro e um filme. Mas quem o formulou pela primeira vez foi o padre dominicano Girolamo Savonarola que, no século XV, em Florença, fazia fogueira de objetos que ele considerava imorais, supérfluos e que incitavam a vaidade como batons, alguns livros etc. O tema deste escrito, entretanto, não é histórico e começa no parágrafo seguinte.

     O ser humano, por natureza, já é muito egocêntrico mesmo. Sempre foi. Vários grupos musicais famosos nos anos 60 e 70 se dissolveram por causa da disputa de ego entre seus integrantes, como é o caso de o Bread, na Califórnia, e dos Beatles, na Inglaterra.

     Todos os ditadores são egocêntricos. Acham que concentram em si o suprassumo da verdade absoluta. Uma parte deles se torna genocida. Stalin foi um bom exemplo. Considerava-se o pai dos povos. Muita gente acreditou cegamente nessa balela. No meio dessa muita gente, havia escritores, artistas, mestres, doutores e intelectuais do mais alto quilate na época, inclusive brasileiros.

     Para lançar muito mais lenha na egocêntrica fogueira humana, surgiu o celular com câmera fotográfica e filmadora. Nunca, em época alguma da história, as pessoas se fotografaram tanto, se filmaram tanto. Sempre se olharam em espelhos, inclusive espelhos d’água como Narciso. Mas agora se olham muito mais em seus celulares ao vivo e em cores. São uns verdadeiros supernarcisos insaciáveis. Olham-se, olham-se de novo e muitas outras vezes. Enviam suas fotos e filmagens para seus amigos, que, por sua vez, enviam as suas também. As palavras que ilustram tantas imagens são sempre de elogios, a maioria falsos: Você está linda, arrasou, quanto charme, lindona, gata linda, deus grego...  Alguns, que são feios de dar dó, acabam acreditando que são bonitos. Quanta ilusão e convencimento!

     Por dia, no Instagram, são publicadas 80 milhões de fotografias aproximadamente. Agora, imagine-se quantas fotos e filmagens são publicadas todos os dia na internet como um todo. São várias as redes sociais além do Instagram. Há ainda blogues,  vlogues e páginas em que a vaidade humana vai ao delírio fotográfico.

Agora vêm as perguntas que precisam ser feitas: o que será de tanta vaidade concretizada em fotografias e filmagens? Vai fazer crescer o número de ditadores no mundo? Vai aumentar a quantidade de egoístas e convencidos? Ou será que haverá um efeito reverso? Será que teremos um mundo mais fraterno e com menos pessoas pedantes?

     Crianças de 5, 6 anos de idade já usam celular. Fazem autorretratos, filmam a si mesmas, sempre muito alegres, brincando, dando gargalhadas e sem ir à escola por causa da pandemia. O que será dessas crianças? Tornar-se-ão pessoas melhores? Ou piores?

     Só o tempo nos dará as respostas.