Eu, você e o racismo

[Pedro Henrique Saraiva]

De volta à 1909. Harry Gordon Selfridge, lojista norte-americano emigrado para a Londres no início do século XX, mudava a maneira como as lojas de departamento se relacionavam com os  clientes. Fora motivado pela indignação. Antes, esse tipo de loja empregava funcionários especificamente a fim de colocar para fora do estabelecimento clientes que entravam apenas a olhar os produtos ou procurar por novidades.

É notícia, ainda, que os vendedores naquela época, apresentavam somente o que achavam ser o mais adequado aos clientes. Estes sequer sabiam de todas as cores e modelos disponíveis do produto que desejavam.

Pois bem. Em 1909, Harry Gordon inaugurava sua loja Selfridge & Co., que mudou um pouco o que acontecia. Fora o responsável por mudar a forma como empresas viam a atividade de consumo. Ela passava a ter um certo prazer, um atendimento mais humano.

Era de se esperar que a preocupação com o cliente e a igualdade em receber bem a todos em nome da lógica do consumo fossem regras mais de um século depois...

 

Passado mais de um século... Em 2021, mais um caso de racismo em lojas vira notícia no Brasil. Numa loja da Zara, em Fortaleza - CE, uma mulher negra é impedida de entrar. Ela é delegada de polícia e relatou que ficou em tal estado de choque e incrédula, que não conseguiu dar voz de prisão ao vendedor.

O caso gerou uma investigação. Revelou-se que a loja chegava a emitir sinais sonoros, com os dizeres “Zara Zerou”, quando pessoas “fora do padrão da grife” entravam no estabelecimento. A prática foi confirmada por duas ex-funcionárias.

No Brasil não somente retrocedemos a ações praticadas em séculos passados, mas a fazemos de formas mais graves e desumanas.

Não pude deixar de pensar: se o comportamento humano é determinado pelos padrões culturais que rolam na sociedade, eu também tenho parte numa ação como aquela que ocorreu na loja em Fortaleza, mesmo que indiretamente.

Então, qual o meu papel no combate ao racismo? Eu realmente tenho tomado ações positivas nesse combate?

Parece mesmo que  “Todo camburão tem um pouco de navio negreiro”:

“É mole de ver

 Que para o negro

 Mesmo a AIDS possui hierarquia,

 Na África a doença corre solta

 E a imprensa mundial dispensa poucas linhas

 Comparado ao que faz com qualquer

 Figurinha do cinema

 Ou das colunas sociais”