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COMEÇO DE TARDE 

  O novo horário do Rio, despertou minha fome. 
  Sentei-me à mesa rústica, de vinhático, enquanto 
  o caseiro fritava pastéis de queijo, que, seriam 
  acompanhados por batatas em salada e tomates, 
  também em salada. 
  Pela porta aberta da sala, eu via o jardim. 
  A bananeira-em-leque, deixava passar as manchas 
  de sol sobre a água da pequena piscina. 
  Os cachorros se acomodaram aos meus pés, no 
  aguardo da minha refeição, onde iam degustar 
  as pontas dos pastéis. 

  Eu ouvia o barulho da diarista lavando roupa no 
  tanque, na parte de trás da casa. 

  As moscas, em volta, anunciavam chuva para o 
  começo da noite. 

  Após o almoço, escurecí o quarto, liguei o venti- 
  lador e repousei no bárbaro calor. 
  Ouvindo um ou outro galo cantar, me veio a ima- 
  gem da grande Fazenda que ora é o lugar onde 
  resido. 
  Vi, de imediato, uma estrada de terra; nela passava 
  uma africana com uma bacia de metal na cabeça, 
  cheia de roupa lavada em um dos ribeirões que 
  descem das montanhas, em direção aos rios en- 
  caixoeirados que se unem no centro do vale que é 
  a Vargem. 
  Atrás da mulher, vinham umas crianças nuas e uns 
  cachorros. 
  Ela se dirigiu para um pátio calçado de pedra, e 
  começou a estender a roupa, que erguia depois, 
  sustentada por varáis de bambú. 

  Para o vegetariano, a Fazenda é cruel. 
  A matança dos animais, o cheiro do sangue empas- 
  tado no chão da degola e da esfoladura das peles, 
  os miudos dos porcos para as linguiças de fumeiro 
  penduradas sobre a fumaça dos fogões de lenha, 
                                       mas, 
  era bom ver o queijo defumado embalançando 
  sobre um dos fogões, pois, as cozinhas das casas 
  grandes, tinham mais de um fogão - o bule de café 
  sobre a chapa, sempre quente para um gole,  as 
  cercaduras de madeira aguardando o cozimento 
  lento no alguidar de cobre, das goiabas cortadas 
  em combuquinhas, vazias de seu miolo molhe 
  cheio de carocinhos, que iam compor a calda, 
  que ia unir a massa para a goiabada então, apa- 
  nhada por uma imensa pá de madeira, enchendo 
  os moldes para os tijolos de goiabada. 

  As redes penduradas nas compridas varandas. 

  Os oratórios perdidos entre as grandes salas. 

   E tudo isso emoldurado pelo passado e do terreno 
   onde moro e que já foi Fazenda, só sei de um 
   morto: 
                 Vitória, a filha de Gonçalo de Sá, 
                  sobrinho do fundador do Rio de 
                  Janeiro, e que está enterrada 
                  bem longe daqui, na Praça Mauá, 
                  nos jardin do Mosteiro de São 
                                       Bento. 

   As tardes induzem à meditação e à nostalgia.