Notícia fúnebre do óbito do coronel Joaquim de Aguiar
Notícia fúnebre do óbito do coronel Joaquim de Aguiar

Reginaldo Miranda[1]

 

Entre os principais líderes da vila do Poti, está o coronel Joaquim José Rodrigues de Aguiar, abastado fazendeiro, líder emancipacionista e seu primeiro administrador, na qualidade de presidente da antiga câmara municipal, com poderes legislativos, executivos e atribuições do judiciário.

Nascido em 25 de julho de 1799, era filho do colonizador português, alferes Francisco José Rodrigues de Aguiar, que ali se estabelecera com criação de gado e plantação de lavouras; e de Angélica Maria de Jesus, esta filha de José da Rocha Pita e Suzana Maria da Trindade. São o tronco da pioneira família Aguiar, na Barra do Poti.

Aliás, seu genitor está entre os moradores dos arrabaldes da Barra do Poti, os quais, em 1815, firmam documento reivindicando a criação da freguesia e vila do Poti. Em 25 de maio de 1816, alcança carta de sesmaria da fazenda Porto Alegre, com três léguas de comprido e uma de largura, situada à margem direita do rio Parnaíba, entre as fazendas Covas e Salobro; em parte desta fazenda, atualmente situa-se um bairro de mesmo nome, na zona sul da cidade de Teresina. Em 18 de maio de 1817, em condomínio com a sogra Suzana Maria da Trindade, o genitor alcançou carta de sesmaria da fazenda Santa Izabel, medindo três léguas de comprimento e uma de largura, situada entre as matas da Alagoa D’anta, Boqueirão, Formosa, Campestre do Sobrado, Saco e gerais do Parnaíba.

Joaquim de Aguiar sucede ao pai na liderança comunitária e, em pouco tempo, ganha notoriedade como um dos principais baluartes na luta pela emancipação política e eclesiástica da povoação da Barra do Poti.

Depois de coroada de êxito essa luta, enfim, é a vila do Poti solenemente instalada em 21 de novembro de 1833. Foi reconhecido pelo povo e eleito vereador para o primeiro mandato da câmara municipal. Na oportunidade, elegeu-se presidente da câmara, podendo, assim, ser considerado o primeiro gestor da vila do Poti. Era filiado ao partido conservador. Durante os quase vinte anos de vida política naquela municipalidade ocupou diversos cargos, ora por eleição popular, ora por nomeação do governo, tais como vereador e juiz de paz.

Possuía diversas fazendas no Piauí e Maranhão, sabendo-se que somente no termo de Passagem Franca, em 1860, amansava com seus parentes cerca de 200 bezerros anualmente[2].

Durante a Guerra da Balaiada, prestou relevantes serviços no combate aos insurretos, fornecendo gratuitamente gêneros alimentícios e dinheiro.

Por portaria de 9 de setembro de 1843, o então major Joaquim de Aguiar foi nomeado para comandante superior da guarda nacional daquele termo. Para esse mesmo cargo, nomearam-no novamente nomeado por decreto de 3 de março de 1849[3].

Por despacho de 25 de março de 1849, foi condecorado com o oficialato da ordem da Rosa, como reconhecimento pelos relevantes serviços prestados[4].

Abolicionista, alforriou diversos escravos, sem ônus, desde o ano de 1872.

Era amante da viola, cantando para seu deleite e dos amigos algumas canções nas horas de folga, como também o era Luiz José da Cunha[5].

De seu consórcio, deixou descendência, constando entre suas filhas, d. Josephina Rosa de Aguiar, que, em 30 de dezembro de 1869, no sítio São Joaquim, distante seis léguas da cidade de Teresina, convolou núpcias com seu parente Fernando Antônio de Aguiar Almendra. “Muitas pessoas das mais gradas desta cidade concorreram a assistir esse ato solene, e tomar parte no festim brilhante que se havia antecedentemente preparado para festejar o enlace desses dois descendentes de uma das mais ricas e importantes famílias desta província”[6].

Foram seus irmãos os coronéis Fernando Antônio de Aguiar, José Cândido de Aguiar, Raimundo Thomaz de Aguiar, Roberto Raimundo de Aguiar e as senhoras Joaquina Rosa de Aguiar, Hermelinda Clara de Aguiar e Maria Sérvia de Jesus, todos influentes na vida política, social e econômica do Poti.

Faleceu o coronel Joaquim José Rodrigues de Aguiar, vítima de pneumonia dupla, em 19 de abril de 1883, com 84 anos incompletos, em sua residência situada no sítio São Joaquim, de sua propriedade, no termo da cidade de Teresina. Transladado para a capital, foi sepultado no cemitério público, “no meio de numeroso concurso de amigos e afeiçoados”, “precedendo as honras, a que lhe dava direito o posto de coronel que ocupara na guarda nacional deste município”.

Segundo a nota fúnebre veiculada no jornal liberal A Imprensa, “no seio da sociedade, ..., gozou ele de perfeita estima e de alto apreço de seus concidadãos”; “exerceu funções públicas e políticas, no desempenho das quais se houve com reconhecido zelo e firmeza de caráter”; “no círculo da vida íntima, ao passo que dava o mais belo exemplo de um verdadeiro pai de família, sabia ser caritativo, distribuindo o pão da caridade, com aqueles que lhe batiam à porta, e concedendo ao mesmo tempo liberdade à muitos dos seus escravos”; era “franco e hospitaleiro”, acolhendo “sempre em sua casa com abundância de coração, tanto o rico, como o pobre, que o procuravam e o frequentavam”; “em dignidade e honradez, se distinguia ele, como um homem de tempera antiga, caráter rígido para quem essas nobres qualidades são sempre uma causa sagrada”; enfim, foi “um protótipo de virtudes, neste vale de lágrimas, onde deixou sinceras afeições e verdadeiras dedicações, como monumento à memória do seu nome”[7].

Por seu turno o jornal conservador A Época, noticiou o óbito advertindo que “A memória de tão distinto cidadão há de perdurar na tradição dos pósteros cercada do respeito e veneração devidos as suas altas virtudes e ao seu coração benfazejo”; “Membro proeminente de uma das famílias mais distintas desta província, gozando de alta consideração social e favorecido pela fortuna, sabia entretanto descer à choupana do pobre para suavizar-lhe as mágoas e a penúria da vida”; “Era uma consciência pura, um coração filantropo, um espírito de tendências pronunciadas para o bem, um desses homens que baixam à sepultura deixando vestígios indeléveis de  sua peregrinação terrestre”; “O partido conservador desta província prantea-lhe a morte, reconhecido aos seus valiosos serviços prestados na defesa de suas ideias em tempos que não vão mui longe”; “Conquanto neste últimos tempos já se houvesse recolhido à vida privada, procurando no doce aconchego do lar doméstico uma situação compatível com a sua idade avançada e incômodos de saúde, todavia a sua morte não pode deixar de ser sentida como um acontecimento fatal para o partido conservador”; “Cercado de prestígio e consideração, respeitado pelo seu caráter, posição social e fortuna, o coronel Joaquim de Aguiar exerceu uma influência benéfica nos diversos transes do seu partido”[8].

 


[1] REGINALDO MIRANDA, advogado e escritor, membro efetivo da Academia Piauiense de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico do Piauí. Contato: [email protected]

[2] A Imprensa, 21.4.1860.

[3] A voz da verdade, 9.5.1849.

[4] Publicador Maranhense, 14.4.1849.

[5] Diário do Maranhão, 13.12.1902.

[6] O Piauhy, 31.1.1870.

[7] A Imprensa, 28.4.1883.

[8] A Epoca, 21.4.1883.