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AS ESTRELAS CADENTES

Novo romance de Rogel Samuel

 CAPÍTULO 1

Acordo no meio da noite, abro a janela e vejo que a noite está coberta de estrelas.

Calor sufocante.

Penso em tomar um banho frio, mas fico algum tempo olhando o céu que se descobre aos meus olhos, ao longo dessas montanhas azuis onde eu agora vivo, longe de tudo, na paz desses meus recentes anos.

Moro só, longe de todos, como afirmei.

Minha única companhia é o garoto Carlos, que aparece de bicicleta, trazendo comida, limpa a casa, dá um dedo de prosa, sorri como todos os adolescentes, e conta algumas novidades.

Meu amigo advogado se encarrega de remunerar a família de Carlos para que faça essa visita diária, ou quase diária.

Carlos tem 17 anos.

Eu 83.

 

CAPÍTULO 2

Aqui eletricidade, celulares, música.

Há oposição de meus amigos ao meu modo de

vida, mas solidão? - não me lembro desse sentimento

há muito tempo.

Uma coisa me está intrigando: As estrelas parecem estar cada vez mais perto, mais baixas, como se estivessem “caindo”.

Talvez eu precise de um novo exame de olhos.

Isso me daria trabalho, teria de marcar uma consulta, ir à cidade etc.

Não quero fazer mais isso.

Não, não preciso não.

Mas para mim, as estrelas estão “caindo”, caindo do céu, desabando em bando, vindo abaixo de uma só vez.

Sim.

Talvez eu esteja louco.

Ninguém reclama, ninguém vê isso, só eu.

Não tenho TV, que aqui não pega, minha Internet é fraca, mas ninguém diz nada.

Só eu vejo esse fenômeno.

Eu esperava que alguém dissesse algo, mas ninguém disse nada.

Nada.

 

 

CAPÍTULO 3

 

A novidade foi que Carlos foi atacado por uma onça que quase o pegou.

 A partir daí eu mandei que ele viesse acompanhado do irmão, que é caçador.

- Você ficou com medo? Pergunto ao Carlos.

- Sim, respondeu ele.

E acrescentou:

- Saí correndo, e foi aí que a onça correu atrás, mas como estava perto de casa ela fugiu, com medo dos cachorros.

- Era onça parda pequena, disse o irmão caçador.

Eu guardo um Taurus 38 cano curto na gaveta.

O irmão falou:

- Já vi coisas piores por aqui. Já vi uma pintada.

- E você não reparou nada de anormal durante a noite? – pergunto ao Carlos.

- Como assim, fez Carlos com um sorriso (ele sorria por tudo).

- Olhando as estrelas...

Aí ele se assustou.

O irmão começou a rir dele.

- Eu nunca olho as estrelas, respondeu, já me olhando desconfiado. Não faço isso, não.

O irmão continuava a rir.

- Nunca?

- Não nunca, eu vou dormir...

- Pois passe a olhar, Carlos, veja se há algo diferente nelas, depois me conte.

Ele riu, mas me olha de modo estranho.

- Tá bom, apressou-se a dizer, mas agora temos que ir, estou atrasado, e montou sua bicicleta e saiu correndo.

O irmão, o caçador Fernando, estava às gargalhadas.

Ele tinha uma espingarda.