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Queime tudo o que puder:

as cartas de amor

as contas telefônicas

o rol de roupas sujas

as escrituras e certidões

as inconfidências dos confrades ressentidos

a confissão interrompida

o poema erótico que ratifica a impotência

e anuncia a arteriosclerose

 

os recortes antigos e as fotografias amareladas.

Não deixe aos herdeiros esfaimados

nenhuma herança de papel.

 

Seja como os lobos: more num covil

e só mostre à canalha das ruas os seus dentes afiados.

Viva e morra fechado como um caracol.

Diga sempre não à escória eletrônica.

Destrua os poemas inacabados,os rascunhos,

as variantes e os fragmentos

que provocam o orgasmo tardio dos filólogos e escoliastas.

Não deixe aos catadores do lixo literário nenhuma migalha.

Não confie a ninguém o seu segredo.

A verdade não pode ser dita.

 

Em Poesia Completa

 

2004