Hugo Lenes Meneses – Doutor em Literatura pela UNICAMP
Francílio B.S. de M. Tridade  – Mestre em Letras pela UPFI
                                                         
1. Precursores:

1.1. Machado de Assis:


“ Não  é à toa que Machado de Assis, antecedendo-se no tempo a tudo isso, pondera que há estados de alma em que a matéria da narração é o nada, o gosto de a  fazer e de a ouvir é que é tudo. Vale observar a atualidade da afirmação. O conteúdo,  a mensagem, deixa de ser primordial, cedendo esta posição à cumplicidade que se estabelece  entre criador e leitor e, ainda, a sugestão de que cria o texto e alguém que o recria no ato de ler “( MARIA, 1986. P. 53)

O próprio Machado de Assis afirmou: “ Arrenego o autor que me diz tudo, que não me deixa contribuir na obra com a minha imaginação .”  

1.2. Umberto Eco:

“Ao escrever o livro Obra Aberta, Umberto Eco desenvolve um conceito dialético entre a obra e seu intérprete. Resulta dessa noção um novo conceito de poético, que confere ao intérprete  os chamados “atos de liberdade consciente” . Estes  lhe conferem uma participação quase tão criativa quanto a do autor. Neste novo modo de ler, um  novo modo de fazer: os artistas lutam por elaborar estruturas cujo significado só se perfaz pela intervenção  crítica do apreciador. Uma obra, assim concebida, apresenta sempre uma infinidade de pormenores ambíguos cujo significado só se precisa pelo concurso do intérprete. Esta umas das razões por que o grande público  se acha divorciado da arte contemporânea, pois ela é inimiga do espectador passivo e inerente. Na obra de arte aberta tudo é dinâmico, de  modo a exigir do observador constante vigilância da descoberta de seus novos significados” ( RODRIGUES et alii, 1979. P. 333 e p. 334).

2. A Estética da Recepção na Atualidade: 

A Estética da Recepção é uma corrente da Teoria Literária, surgida no final da década de 60, na Universidade de Constança – Alemanha, onde foi exposta pela primeira vez em 1967, por Hans Robert Jauss.

Segundo o referido teórico, a Estética da Recepção consiste numa pesquisa sobre a recepção da literatura e seus efeitos no leitor e visa superar o Formalismo Russo, o Marxismo e o fechamento do Estruturalismo, que não dava conta da dimensão histórica, diacrônica da obra literária, atrelando-se em um cientificismo exagerado, calcado no modelo lingüistico saussereano. 

A Estética  da Recepção procura empreender uma análise transcendente da obra literária, deslocando o eixo de investigação da mensagem para a sua recepção pelo leitor. Não se trata mais de uma estética da produção ( eixo autor-texto),  ou da representação (ênfase no imaginário), mas sim uma estética da recepção (relação do autor com a obra  dentro de um contexto dado).

Jauss recusa a teoria tradicional dos gêneros e propõe a análise da experiência do leitor ou da sociedade de leitores de um tempo histórico determinado. Por esta colocação de Jauss, percebe-se a  abrangências dessa teoria, que procura abarcar a análise sociológica, histórica , pscicanalítica e  hermenêutica, não só do texto literário, como também da sua relação com o leitor, visto no conjunto da sociedade.

Wolfgang Iser, teorizando sobre a recepção da literatura pelo leitor, afirma que este, diante dos vazios do texto isto é, espaços abertos para a plurissiginificação, deverá preenchê-los com a sua própria imaginação. Isto porque o texto literário não é constituído somente de linhas, mas também das entrelinhas, dos interditos, das suas lacunas e, sobretudo, do ato de ler.

“ O leitor, em seu importante papel, imagina hipóteses, decifra, analisa, cria vínculos entre  uma obra  e outra (...) o autor dá pista ao leitor  para  que co-participe, como  um elemento a mais do romance, abrindo  novas perspectivas e recriando a história que lhe foi apresentada. Esta liberdade criadora que se oferece ao leitor,  tarefa de decifração e integração, dá-lhe a sensação de  não se afogar passivamente no mundo da literatura e  de que as personagens retornaram a um museu depois de passagem transitória pela vida “(JOZEF, 1980. P. 71-2)  “ ... no espaço literário contemporâneo não se pode conceber uma separação entre criação e crítica . O texto só existe na medida de sua leitura”. ( JOZEF, 1980. P. 154).

A  produtividade do texto literário “ é a sua capacidade de produzir sentidos  múltiplos e renováveis, que mudam de leitura a leitura. Ler não seria, então, aplicar modelos prévios, mas criar formas únicas, que são formas virtuais do texto ativadas pela imaginação do leitor “ (MOISÉS, 1985. P. 50). Noutras palavras, o leitor funciona como o co-autor do texto.

Deste modo, os teóricos da Estética da Recepção criam a possibilidade de um “leitor ideal”, que preencheria os vazios do texto com  uma leitura interpretativa.

 Lucie Dallenbac oferece um esquema do funcionamento da Estética da Recepção, na atualidade , em que se observa a relação recíproca de quatro elementos:

1) Sujeito e processo de produção;
2) Texto;
3) Sujeito e processo de recepção e
4) Contexto histórico e inconsciente.

Para Dallenbach, a principal tarefa da Estética da Recepção é articular todas essas instâncias com o sujeito de recepção, que, no caso de literatura, é o leitor.

Hans Ulrich Gumbrecht afirma  ser impossível uma normatividade quanto à existência de uma única leitura “boa” ou “correta” do texto. O interesse da Estética da Recepção é compreender a diferença das diversas exegeses de um texto. 

 
CONCLUSÃO

 

O nosso objetivo foi apresentar a corrente da Teoria da Literatura denomina Estética da Recepção , e, no desenvolvimento deste trabalho, fizemos a referida apresentação, a qual nos permitiu concluir o seguinte:

a) a Estética da Recepção é uma teoria de grande amplitude, pois procura analisar a obra literária envolvendo todos os elementos do processo da comunicação, com ênfase no receptor;

b) a Estética da Recepção concede autonomia ao texto literário de organizar seus próprios significados, a partir da ênfase na construção da leitura pelo receptor;

c) a  figura do “leitor ideal “ é  um problema a ser resolvido pela a Estética da Recepção. Isto, porque determinar um “leitor ideal” seria igualar todos os componentes  de uma  sociedade ao mesmo “gosto” e “cultura literária”, o que constitui uma  concepção elitista da arte.

 

BIBLIOGRAFIA

 

JOZEF, Bella. O jogo mágico. Livraria José Olympio editora,  Rio 
       de  Janeiro, 1980. P. 71-154

MARIA, Luiza de. Encanto radical – machado de assis. Ed. Brasiliense
         São Paulo, 1986. P. 53.

RODRIGUES, A Medina “et Alii”. Antologia da literatura brasileira. Mar
         co  Editorial ,São Paulo, 1979. P. 333-34.

SAMUEL, Rogel (org.) “et Alii” . Manual de teoria literária.  Ed. Vozes,
        Petrópolis, 1989.