[Maria do Rosário Pedreira]

Quando andava na Faculdade, trabalhava três horas por dia no escritório do meu pai, dactilografando em três vias de papel selado com químicos pelo meio várias acções cíveis. Não era nem por sombras tão rápida como uma dactilógrafa profissional que estava lá todo o dia há muitos anos e que era capaz de bater sei lá quantas palavras por minuto; no entanto, no fim da tarefa, eu sabia o que estava escrito naquelas folhas azuis de fio a pavio, enquanto ela, que trabalhava palavra a palavra, não fazia a mais pequena ideia sobre o que versava o texto que dactilografara. Tal comportamento sempre me espantou e, quando já estava na edição, trabalhei com um paginador que era o oposto da senhora. Já na época da fotocomposição, a ele bastava-lhe importar um ficheiro Word e estender o texto num formato predefinido  – e para isso não tinha de «escrever» realmente nada –, mas a verdade é que não raras vezes me levava as provas com gralhas e erros assinalados, antecipando-se claramente ao revisor. Descobri mais tarde que este paginador adorava ler e não resistia a dar uma espreitadela aos livros todos em que trabalhava. Já a dactilógrafa não tinha, provavelmente, grande gosto pela leitura